MINAS DO DISTRITO DE BEJA POR Aboim Inglês

Ano: 
1932
Autor: 
Album alentejano
Editor: 
Pedro Batalha
Descrição: 

MINAS DO DISTRITO DE BEJA
Aboim Inglês
EXISTEM atualmente no distrito de Beja: 64 concessões de manganês 16 de ferro, 32 de cobre, 5 de chumbo, 1 de antimónio e 2 de amianto ou sejam 120 ao todo. Desde os tempos os mais remotos que algumas destas minas foram trabalhadas como se comprova pelos escoriais, escavações, e outros vestígios desse labor desde a idade da pedra até hoje. Nas escombreiras de Vale d'Oca na Mina de Algares, Aljustrel, encontrei um martelo e um machado de diorite, com sinais bem marcados de muito uso, que foram provavelmente instrumentos de escavação da pequena corta do filão Oeste que exis- te ao lado. Na mina do Bogalho também se encontraram martelos ovais de diorite indicativos de trabalhos na idade, provavelmente do bronze, bem como nas de Barrancos, e nas de Brancannes e Barrigão perto de Almodôvar. Depois destes povos primitivos foram as minas do distrito trabalhadas pelos celtiberos, turditanos, fenícios, cartagineses, romanos, mouros e portugueses. O trabalho mais comprovado pela documentação encontrada foi o dos romanos. As taboas de bronze encontradas na mina de Algares, Aljustrel e as inúmeras moedas principalmente de Augusto, Tibério, Vispasiano e Adriano, e ferramentas encontradas ali, em S. Domingos e noutras minas, provam bem claramente o largo espaço de tempo que as minas trabalharam sob aquela denominação. Repito o que tenho dito e escrito sobre o assunto: julgo que as primitivas invasões sofridas pela nossa terra foram motivadas pela exploração mineira. Já Políbio antes de Plínio tinha dito que os fenícios ao invadirem a Peninsula encontraram um povo de bárbaros, os celtiberos, que possuindo preciosas minas não sabiam delas tirar proveito. O espírito mercantil dos fenícios lançou a semente da civilização nos turditanos, tribo que ocupava então uma parte de Portugal. Pacificamente enriqueciam-se os fenícios à custa do ouro, prata, estanho e cobre que ensinaram a extrair das minas, sendo assim úteis a si e aos nativos. A tradição diz que os fenícios tinham âncoras de prata nas suas naus e os turditanos usavam todos os seus utensílios e ferramentas também de prata; tal era a riqueza superficial das nossas minas. Depois de séculos de denominação fenícia, os nativos já conhecedores da riqueza das suas minas e dos seus processos de exploração, quiseram libertar-se do domínio invasor. Não podendo os fenícios só por si dominar a revolta pediram auxílio aos cartagineses e assim sufocam a rebelião; mas os romanos que já conheciam a riqueza mineira da Península disputam a conquista à traição, obrigam os cartagineses a fugir para Africa e ficam nossos dominadores. Nesta série de dominações a nossa terra apenas tinha mudado de exploradores. Os pretores romanos a ferro e fogo nos dominaram durante seculos, vivendo sempre de perseguições, e rapina, o que produziu de novo a revolta do povo, que n'uma luta heroica se prolongou até á paz octaviana. Depois dos romanos os árabes também trabalharam as nossas minas, co- mo se prova por documentos recentemente encontrados. Depois os portugueses. Os documentos de arqueologia Mineira encontrados em Portugal têm sido em grande parte encontrados no distrito de Beja. São quási todos de época Romana, sobressaindo entre eles pela sua grande importância as tábulas de bronze encontradas na Mina de Algares, Aljustrel.
A primeira tábula encontrada n'uma galeria de Mina Algares em Aljustrel, em 1876, tem nove capítulos, que regulam como se vê na transcrição feita a pag. 49: 1º A renda que o arrematante tem direito a receber e como o deve fazer na região Mineira Vicus Vipascencis. Parece ser este o nome porque a região mineira de Aljustrel era então conhecida. 2º As percentagens a que tem direito por leilões, de objetos, escravos, poços, animais, etc. 3º As condições da exploração do balneário para homens, mulheres, libertos ou escravos, que já existia. 4º O monopólio da venda de calçado, correame e pregos a favor do rendeiro (provavelmente das minas). 5º О monopólio do serviço de barbeiro também a favor do rendeiro. 6.°O monopólio, também d'este, do fabrico de panos para vestuário. 7º Regular o quanto se deve pagar pela exploração do minério de prata tanto d'esta mina como d'outro que tragam de fora. 8º-Isenta os professores do pagamento de impostos. 9º-Impõe a obrigação de dar conta ao rendeiro dos poços e trabalhos que abrir, segundo a lei de minas pelo que pagará impostos. Como se vê por esta síntese esta tábula é principalmente parte d'um regulamento de impostos cuja análise é interessante. Na 2ª tábula encontrada nos escoriais de Malpique, perto da mina de Algares em 1906, o assunto é mais mineiro e faz conjunto com a primeira. Esta tábula é mais interessante que a 1ª. É de bronze tem 0.m77×0.55×0,01 e está também escrita em latim. Foi comentada pelo Professor Eduardo Cuk da Faculdade de Direito da Universidade de Paris, tendo publicado n'uma separata das “Melanges Gerardins” em 1907, interpretações jurídicas interessantes. Julga este professor que as tábulas não seriam feitas para estas minas por dizerem respeito a minas de prata e as minas d'Aljustrel serem atualmente de cobre. Ora as tábulas foram feitas quando a exploração d'estas minas se fazia no contacto dos chapéus de ferro e zonas de oxidação ricas em prata e ouro onde se exploravam estes metais como há poucos anos se exploraram também na mina da Caveira do concelho de Grândola, onde ainda se podem ver os grandes tanques de ferro e maquinismos que para isso se usaram. E se essa prova não fosse bastante, examinando os escoriais da mina de Algares, onde foi encontrada a 2ª tábula vamos encontrar que eram tão ricos em cobre que a atual Empresa exploradora aproveitou como minério e pela hidrometalurgia extraiu d'eles alguns milhares de toneladas de cobre metálico. Ora se a mina d'Aljustrel tivesse sido naquela época trabalhada pelo cobre não teria ele ficado nas escorias d'onde mais tarde se extraiu.

E tanto é assim que existem ainda escoriais já tratados pelos antigos por cobre e que não merece a pena tratar agora. Mas há mais: a 2ª tábula veio explicar-nos a razão porque os poços romanos de Algares eram simples enquanto que em todas as outras minas são gémeos quer dizer aos pares. Pelo regulamento expresso na 2ª tábula cada poço era uma concessão mineira, que pagava os seus impostos e assim faziam poços simples para pagar menos impostos. O não haver atualmente galeria de esgoto e o regulamento falar d'esta galeria, apenas quer dizer que o Professor Cuk foi mal informado: a antiga galeria de Sª Barbara sobre a região do Poço Caiado de Algares era um esgoto romano. Por tudo isso eu creio que as tábulas foram feitas para as minas de Aljustrel, cuja exploração durou vários seculos como demonstrou os vários tipos de trabalhos, de utensílios, de moedas e de escorias que ali se tem encontrado. A 2ª tábula foi posterior á 1.ª o que se reconhece pela paleografia, mas em época pouco distante, como provam os arqueólogos, deve ter sido escrita no reinado de Hadrien (117 a 138). Nesta tábula preconiza-se um método de trabalho de exploração das minas que não consta de qualquer regulamento anterior conhecido. Regulariza a venda dos poços, condições da ocupação e transmissão. Reconhece os direitos dos colonos e até fomenta a formação de sociedades entre eles ou de estranhos, sancionando com formalidades a formação dessas sociedades, seus acordos, sua marcha e até á sua dissolução. Impõe medidas de segurança na execução dos trabalhos da pesquiza e exploração; estabelece as primas que Adriano deve receber das minas de prata e os poderes administrativos e judiciários do Procurator.
Por estas sínteses se vê que as tábulas são documentos arqueológicos dos de maior valor que se têm encontrado; e que será possível ainda encontrar outras completando a Lei de Minas Romana de que estas de- vem ser apenas fragmentos. Nas Minas de S. Domingos, Aljustrel Juliana. Barrigão e Barrancos encontraram-se moedas, ferramentas, utensílios e escoriais assinalando os trabalhos dos antigos povos; mas principalmente dos Romanos. Por o exame dos escoriais pode calcular-se em mais de um milhão e meio de toneladas de minério a extração dos trabalhos romanos. Podemos dizer que extraíram muito e deixaram tudo; mas isso mostra o poderoso fator económico que o distrito de Beja sempre foi. Vejamos o que são atualmente as minas e o que que podem ser no nosso distrito: Minas de pirita e ferro cuprífera Minas de S. Domingos concelho de Mértola. Minas de Algares e S. João do Deserto, concelho de Aljustrel. Mina do Montinho concelho de Ourique. Mina de S. Domingos Fica situada a 17 Quilómetros de Mértola a 67 de Beja e a 18 do porto de Pomarão, porto d'embarque dos minérios, no Rio Guadiana, aproximadamente a 50 km da sua foz. Vila Real de S.to António. O jazigo compõe se de uma grande massa da pirita ferro-cuprifera de 600 metros de comprimento por 60 m. de largura máxima, estando conhecido até aos 300.ms de profundidade. Os antigos trabalharam durante seculos este jazigo havendo vestígios do seu labor desde o ano 12 ao 385 da nossa era. O volume dos trabalhos antigos desta mina foi calculado uns 150.000 m. o que corresponde a uma extração de aproximadamente 650.000 toneladas.
Esta mina foi registada em 1857 por Nicolau Biava e concedida em 1858 a Ernesto Deligny Luiz Decazes e Eugénio Leclere, como cessionários de Biava. Foi concedida definitivamente em 1859 e reconhecido como Director o engenheiro inglês Diogo Mason proposto pelos concessionários. A concessão foi transmitida a uma Sociedade anonima de responsabilidade La Sabina constituída em Huelva, com sede em Paris e legalizada em Portugal, que ainda hoje é a concessionária da mina. Esta companhia arrendou a mina á firma inglesa Mason & Barry, representada em Portugal por Diogo Mason. Visconde Mason de S. Domingos. Até 1877 foi explorada por esta sociedade individual e de então para cá por Mason & Barry, L.da. Esta Empresa que tem trabalhado otimamente durante a sua já longa existência continua florescente. É proprietária de 1.850 hectares de terrenos ao redor das minas, onde tem implantado as suas instalações, sem luxo; mas cobrindo todas as necessidades. Aqui pode bem aplicar-se o rifão mineiro, pois há um lugar para cada coisa e uma coisa para cada lugar. Começou a exploração pelo método de trabalhos subterrâneos de pilares e maciços que foi substituído pela exploração a céu aberto ou de Corta. Desta enorme escavação que pôs a descoberta a parte superior do minério até ao piso 120 m. e têm-se extraído mais de 50.000 000 m. de estéril que lançados nos vales circunvizinhos modificaram o aspeto e orografia adjacentes. Sendo impossível ir mais fundo por exploração a céu aberto continuaram com pisos subterrâneos por cortes e relhenos. Até ao piso 150 faz-se a extração por poço vertical por meio de jaulas transportando os vagons contínuos que depois são engatados no cabo sem fim para subir pelo tunel inclinado automaticamente á superfície a uma instalação trituradora e classifica- dora por tamanhos, onde o minério é dividido nos vários tipos que ou é levado á cementação para produzir (Cascara de cobre) (producto com 70 a 80% cobre), ou é exportado pelo seu caminho de ferro até ao porto de Pomarão no Rio Guadiana, onde a Empresa tem depósitos e instalações para cargar dois vapores por dia. O tratamento metalúrgico da hidrometalurgia natural, isto é: sem calcinação, foi empregue pela primeira vez com êxito na Mina S. Domingos. Foram mr. Joel, mr. Harvey e o Capataz Manuel Joaquim os grandes pioneiros deste método que enriqueceu a Empresa e tornou possível o aproveitamento dos Milhões de toneladas de enxofre que nos últimos 50 anos se tem transformado um ácido sulfúrico, provenientes das minas de Espanha e Portugal. Aqui quero prestar á sua memoria a minha modesta homenagem! Nos 70 anos de exploração tem a mina S. Domingos produzido no local 120.000 toneladas de cobre que á média de 60 perfaz a bonita soma de £ 7200.000 ou seja ao cambio atual 720.000 contos! A Empresa tem a seu cargo e por sua conta a dragagem da barra do Guadiana para o que tem o seu material e pessoal. A aldeia de S. Domingos foi construída pela Empresa alem do palacete da Direção e Escritórios, tem casas para o pessoal superior, 1600 quarteis para operários, Hospital, Farmácia, Igreja, Teatro, Escola, Cooperativa, clubs, jogos, jardim, etc., etc. A população é superior a 4.000 habitantes e os operários costumam ser mais que 2000. Os serviços médicos e de farmácia são grátis. Os serviços de higiene publica são também por conta da Empresa: poços d’água potável, lavatórios, retretes, ruas e fiscalização dos quarteis são objeto de constantes cuidados. Estes cuidados e a guerra ao mosquito reduziu a malaria que existia em S. Domingos a quási nada. Muito teria que detalhar na breve descrição desta mina; mas a índole desta publicação não mo consente.(...)

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